26 de outubro de 2008

SPACE INVADERS



Apesar do título sugestivo, não, eu não vou falar sobre vida extra-terrestre! Eu ia continuar com a questão do desenho experimental, mas este mês foi publicado um artigo super interessante que me remeteu aos (velhos?) tempos da graduação em genética e não resisti comentar aqui.

A história começa quando um grupo da Universidade do Texas em Arlington (EUA) estava estudando transposons no genoma da espécie Otolemur garnettii (ou bushbaby). Transposons são seguimentos de DNA que podem se mover dentro de um mesmo genoma fazendo uma cópia de si mesmo e a inserindo em outro local ("copy and paste”) ou “recortando-se” de um local para se inserir em outro ponto do genoma (“cut and paste”) e neste processo podem carregar genes adjacentes e causar mutações.

Eles então resolveram comparar as seqüências de uma superfamília de transposons que acharam no bushbaby com as seqüências de outros animais. E, surpreendentemente, eles encontraram seqüências praticamente idênticas em 7 outras espécies inclusive em uma espécie de anfíbio e em um réptil, enquanto que as mesmas seqüências não foram encontradas em outras 19 espécies de mamíferos pesquisadas. O intrigante é que estas seqüências altamente conservadas apresentam um padrão descontinuo na árvore filogenética, aparecendo em grupos não diretamente relacionados, como se tivessem dado saltos entre eles. Estimou-se que as seqüências tenham surgido e evoluído por pelo menos 15 milhões de anos, enquanto estes grupos divergiram há 350 milhões de anos. Como os transposons pareciam “surgir do nada” nas diferentes espécies analisadas, eles deram o nome de “Space invaders” (SPIN). Mas, então, como explicar a ocorrência dos spacer invaders nestes grupos?


Estes dados são uma forte evidência de que estas seqüências não foram adquiridas verticalmente, ou seja, através da reprodução de ancestrais, mas horizontalmente. A transferência horizontal (ou lateral) de genes consiste na transferência de material genético de um organismo para outro “não descendente” e pode ocorrer mesmo entre organismos de espécies diferentes. Este evento é muito comum entre bactérias que podem, por exemplo, assimilar fragmentos de DNA liberados após a lise de outras bactérias presentes no ambiente.

Mas em eucariotos isso não é nada comum. Como estas seqüências “saltaram” entre os genomas de mamíferos e répteis? Feschotte, líder do grupo que realizou o estudo, acredita que possivelmente estes transposons tenham sido transferidos entre estas diferentes espécies por meio de infecções virais. A introdução dos SPINS nestes genomas têm uma importância evolutiva grande uma vez que, por exemplo, no genoma do tenrec estas seqüências se duplicaram até atingir um número de 100 mil cópias e no rato e no camundongo, estes transposons deram origem a um novo gene funcional.

O trabalho “Repeated horizontal transfer of a DNA transposon in mammals and other tetrapods” foi publicado na PNAS de outubro/2008.

Você pode ler sobre os SPINs na G1 ou na GenomeWeb News (em inglês, com cadastro).

20 de outubro de 2008

Desenho experimental é tudo!


Todos que trabalham com ciência sabem ou deveriam saber disso. Isso porque o desenho experimental é crucial para que se consiga o tipo e a quantidade de dados que realmente podem responder a pergunta de interesse. Logo, o primeiro passo é sempre identificar que perguntas específicas serão investigadas com o experimento em questão e definir quais tratamentos (grupos experimentais) e controles utilizar, assim como quais variáveis (os “tipos de dados”) devem ser monitoradas em função dos tratamentos utilizados para que seja possível responder as perguntas estabelecidas. Uma outra questão extremamente importante é identificar as fontes de variabilidade existentes. Todas estas questões são assunto para 1 ano de posts...mas, recentemente, eu tive uma aula sobre desenho experimental na área de proteômica onde se discutiu a problemática das fontes de variabilidade e a importância das réplicas, principalmente, biológicas...questões sobre as quais eu já vinha pensando e que despertaram ainda mais meu interesse. Portanto, por enquanto, vou me focar neste ponto.

Por que identificar as fontes de variabilidade é tão relevante? Em geral, o objetivo de um experimento é avaliar os efeitos de um “tratamento”, por exemplo, a exposição a uma substância tóxica, no organismo ou modelo de estudo. Em contraste com um estudo de “observação” onde dados são obtidos e analisados sem que as condições sejam alteradas. Para determinar que os efeitos observados através de um experimento são resultado do tratamento utilizado é preciso ter o máximo de controle sobre todas as possíveis fontes de variabilidade (que não o tratamento) que podem interferir nos resultados para que desta forma se possa determinar que os efeitos observados estão de fato relacionados com o tratamento. Estas fontes podem ser tanto técnicas quanto biológicas. Em geral, as pessoas se preocupam mais com a variabilidade técnica cujo grau depende, obviamente, das técnicas utilizadas. No entanto, a variabilidade biológica também pode ser uma grande pedra no caminho, especialmente, em experimentos que avaliam alterações na expressão gênica de milhares de genes como os microarranjos de DNA e a proteômica. As fontes de variabilidade biológica são inúmeras: diferenças genéticas, de idade, sexo e de estado nutricional entre os indivíduos, no caso de cultura de células: o número de passagens, a linhagem utilizada, a densidade de células e o tempo de cultivo da linhagem (no caso de culturas primárias) são relevantes.

Para lidar com esta variabilidade a utilização de réplicas (técnicas e biológicas) é essencial. Uma réplica técnica consiste em analisar uma mesma amostra biológica independentemente mais de uma vez, enquanto que uma réplica biológica consiste em analisar amostras biológicas provenientes de diferentes indivíduos. Esta estratégia auxilia a reduzir a variabilidade não relacionada com o tratamento e, assim, a detectar variações “verdadeiras” com maior precisão, além de possibilitar que os dados sejam avaliados estatisticamente. No curso de proteômica, foi comentado que, estatisticamente, as réplicas biológicas são mais relevantes que as técnicas e que vale a pena aumentar o número de réplicas biológicas mesmo em detrimento do número de réplicas técnicas. Mas, falando de estatística eu estou entrando em terreno praticamente desconhecido para mim...ao menos por enquanto, pois pretendo e, principalmente preciso(!!!) mudar isso.
Bom, eu escrevi uma página e acho que não disse muita coisa, então, continuo na próxima vez! Ciao!

11 de outubro de 2008

O fim (?) da novela "primer design"

Só para fechar esta questão dos primers: um guideline no site da Premier Biosoft (a empresa do netprimer e do primerpremier) me ajudou bastante fornecendo os valores toleráveis de deltaG para cada uma das possíveis estruturas secundárias para os primers em questão. O deltaG (variação de energia livre) indica a quantidade de energia necessária para romper com a estutura secundária e é utilizado como uma medida da estabilidade destas estruturas. Quanto mais negativo for o deltaG, mais estável é a estrutura e, portanto, piores são os efeitos no PCR! Mas, não é preciso ficar desesperado como eu fiquei quando o programa acusar estruturas em todos os seus primers. Se o deltaG for baixo, provavelmente, aquela estrutura não vai se manter na temperatura de anelamento dos primers durante o PCR e não vai interferir na eficiência da reação de amplificação. Por enquanto, meus primers estão ok, embora nem todos estejam funcionando (mas acredito que por outros motivos).

Para saber mais e conhecer os valores de deltaG toleráveis em cada caso: http://www.premierbiosoft.com/tech_notes/PCR_Primer_Design.html

No próximo post, vou falar sobre outro tipo de "design" :)