Mas o que é um RNA de qualidade? Em primeiro lugar, como ficou evidente no último post, um bom RNA deve estar íntegro (as moléculas não devem estar fragmentadas). Além disso, o RNA deve estar puro, ou seja, livre de contaminantes como sais, etanol, lipídeos, polissacarídeos, proteínas, fenol, clorofórmio e outras substâncias que podem estar presentes nas soluções utilizadas na sua extração ou no tecido de origem. Isto é especialmente importante no caso em que o RNA será utilizado em reações enzimáticas, uma vez que estas exigem condições químicas específicas, além de serem suscetíveis a inibição por uma série de compostos.
Para avaliar a pureza de uma amostra de RNA, assim como para quantificá-lo, a opção é obter o espectro de absorbância da amostra utilizando um espectrofotômetro. Nos aparelhos tradicionais, a amostra é colocada em uma cubeta, o que exige um volume considerável de amostra, mesmo estas sendo diluídas. Com um espectrofotômetro mais moderno, como o Nanodrop (não estou fazendo propaganda), é necessário utilizar apenas 1 ul de amostra para se obter um espectro completo, preciso e quase sempre sem que seja necessário diluir a amostra, além de detectar concentrações de RNA ínfimas como 2 ng/ul. Em 10 segundos, você tem na tela um gráfico mostrando o espectro (220-750 nm) além de outras informações como concentração de RNA, razões 260/280, 260/230, etc.

O pico de absorbância do RNA é a 260 nm (Uma leitura a 260nm igual a 1.0 equivale a 40 ug RNA/ml). Uma amostra de RNA deve exibir uma curva em formato de sino, com um único pico em 260 nm. Proteínas apresentam um pico de absorbância a 280 nm e outros contaminantes (como sais, polissacarídeos e compostos orgânicos como fenol) apresentam pico de absorbância em torno de 230 nm. Por isso, a razão das abs. 260/280nm é freqüentemente utilizada para avaliar a contaminação por proteínas, sendo o valor de referência (amostra livre de proteínas) igual a 2.0 (o que varia um pouco na literatura). E a razão das abs. 260/230nm é utilizada para avaliar a contaminação por outros compostos (valor de referência também em torno de 2.0 – e também não é consenso). Logo, seu RNA está OK se a curva obtida for parecida com a vermelha no gráfico abaixo.
1) Submeter o RNA a eletroforese em gel de agarose em condições desnaturantes (existem diferentes protocolos disponíveis);
2) Realizar northern blot para algum gene housekeeping altamente expresso (como por exemplo, actina), embora esta técnica não seja mais muito usada como meio de avaliação da expressão gênica, ainda pode ser útil neste contexto;
Através de um gel de agarose desnaturante, é possível deduzir a integridade do RNA através da visualização das bandas de RNA ribossomal. A presença de rastro abaixo das bandas de rRNA indicam degradação e, acima delas, pode indicar contaminação por DNA genômico (o que pode comprometer resultados futuros). Portanto, um RNA legal deve apresentar bandas bem definidas e sem rastros (como na foto por trás do título do blog :-). Além disso, a banda referente ao rRNA 28S deve apresentar o dobro da intensidade da banda do rRNA 18S. Este parâmetro tenho sido bem utilizado (através do cálculo da razão entre as intensidades das bandas 28S/18S que deve ser igual a 2.0, mas este valor pode variar entre diferentes espécies e tecidos). No entanto, esta técnica exige uma quantidade considerável de RNA (pelo menos, 1 ug, o que pode ser limitante para alguns), além de somente detectar um grau considerável de degradação (suficiente para exibir um rastro no gel e alterar a razão 28S/18S calculada a partir da análise da imagem dele) e demandar mais tempo e trabalho.
Por fim, o bioanalyzer tem sido considerada a melhor opção, mas ainda não é um equipamento comum nos laboratórios. Exige pequenas quantidades de RNA (até 200 pg de RNA total!) e utiliza um corante fluorescente que permite avaliar tanto a integridade quanto a concentração de RNA na amostra. O princípio é o mesmo de uma eletroforese em gel de agarose, mas a corrida é feita em um capilar contendo o polímero e é gerado um eletroferograma (a direita do gráfico abaixo) o qual é analisado automaticamente pelo aparelho que detecta qualquer traço de degradação. O resultado é exibido na forma de um gráfico, como o abaixo, através do qual é possível calcular a razão 28S/18S com maior precisão a partir dos respectivos picos. Além disso, existem softwares que utilizam um algoritmo para analisar os resultados obtidos e atribuir à amostra uma pontuação (RIN – RNA Integrity Number) que varia de 1 a 10. Coisa de primeiro mundo!

O que eu escrevi aqui é pouquíssimo perto da quantidade de informação disponível sobre o assunto, para saber mais acesse os links abaixo. Em qualquer site de busca em periódicos (pubmed, science direct, web of knowledge, etc) é possível encontrar bons artigos sobre o assunto.
No próximo post, eu pretendo falar sobre como tenho avaliado a qualidade das amostras de RNA total que tenho extraído, dos resultados obtidos e de algumas modificações que fiz no protocolo de extração para melhorar a qualidade das amostras.
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